sexta-feira, 22 de julho de 2011

Ondskan (2003)

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Cruel de Mikael Håfström foi um filme que só pelo seu extraordinário trailer e pela sinopse me conquistou imediatamente.
Este magnífico filme sueco começa com a expulsão de Erik (Andreas Wilson) do seu colégio depois de um violento segmento de luta em que esteve envolvido. Impedido assim de concluir os seus estudos, a mãe de Erik envia-o para um colégio privado que o aceita e onde terá hipótese de finalizar os seus estudos sem problemas... ou assim pensava.
Aquilo que Erik encontra no seu novo colégio é um sistema de dominação e subjugação dos alunos considerados mais fracos ou fora da classe dominante de membos conservadores e de extrema-direita que controlam tudo e tudo pela opressão e intimidação.
Erik que havia prometido à mãe não se meter em problemas dá por si a lutar contra todo o tipo de dominação que querem exercer sobre si naquela que é uma das mais bem sucedidas lutas contra a tirania e que acaba com proporções bem dramáticas.
Falar deste filme não é tão simples como pode inicialmente parecer e por detrás daquilo que poderemos ver como um ajuste de contas entre membros de dois cãs bem distintos existe realmente toda uma questão cultural que os caracteriza.
Temos de analisar em primeiro lugar o contexto em que este filme decorre... Uma Suécia pós-segunda guerra mundial onde muitos membros da classe dominante e conservadora tinham reais simpatias com o nazismo alemão recentemente extinto (?) e que ainda professavam naquele país "neutral" muitas das doutrinas que ensombraram a Europa durante largos anos.
Em segundo lugar temos de perceber que uma classe mais abastada e tradicionalmente ligada a valores religiosos e de dominação política ultra conservadora onde o bom nome de família era bem mais importante do que valores morais e humanísticos continuava ainda a dominar aqueles que eram tidos como liberais, progressistas e com ideias de inovação e igualdade para todos. Estes últimos tidos como elementos subversivos e como tal desrespeitadores eram o alvo perfeito a abater.
A luta e a distinção de classes bem como a clara distinção entre um Sul pouco trabalhador, calão e com características rácicas menos perfeitas (sempre tão presente) para com um Norte honrado, perfeito e de características alvas e defensoras da moral e bons costumes são elementos que caracterizam muito de um povo e de uma sociedade que se apresenta progressista mas que na realidade está parada num espaço temporal a anos luz dos valores que realmente importam como a dignidade e a moral de respeito para com o próximo.
A defender estes valores bem distintos temos duas interpretações de excelência. A representar o futuro, o progresso e a igualdade temos um notável Andreas Wilson que apesar de ter aqui um dos seus primeiros trabalhos cinematográficos tem também aquele que será seguramente para sempre o filme pelo qual será recordado. Erik Ponti, a personagem à qual não só dá corpo como alma, assume-se durante todo o filme como o anjo vingador que não irá tolerar qualquer tipo de injustiça da qual também ele se sentiu durante tanto tempo vítima às mãos de um padrasto castrador e socialmente frustrado.
Do outro lado temos um notável Gustaf Skarsgård que encarna um Otto Silverhielm herdeiro de uma família abastada e nobre que através do medo, da intimidação, subjugação e tortura mantém a pirâmide social a seu favor fazendo-o em nome daquilo que é correcto... a classe dita perfeita sempre no topo.
Estas duas personagens dotadas de uma perfeita alma, que se encontram nos antípodas uma da outra, vivem numa constante tensão que percebemos ir facilmente terminar num conflito de tal ordem grande que apenas um irá poder conseguir resistir.
Este filme tem momentos em que nos provoca um mau estar constante pois através de rostos perfeitamente "inocentes" recebemos uma constante selvejaria e momentos de tão grande humilhação que seria impossível sentirmo-nos de outra forma.
E é precisamente aqui que reside o grande triunfo deste filme. É óbvio que ao longo dele conseguimos forçosamente simpatizar com uma das personagens mas, mesmo esta não está isenta de culpa e de também pactuar com a "necessária" violência a que tem de se sujeitar para pôr termo às injustiças de que ele, e os seus poucos amigos, são alvo. Acabamos assim por de certa forma concordar com a própria violência em nome do bem-estar e da defesa da honra. A honra através da violência... A tranquilidade através da violência e, no fundo, a paz através da violência.
Este filme sueco que fora nomeado a Oscar de Filme Estrangeiro e do qual não saiu, infelizmente, vencedor é das melhores e maiores surpresas que poderia vir do cinema europeu nos últimos anos. Bruto mas não insensível, directo e de extrema violência não deixa no entanto de ser doseado com breves e muito esclarecedores momentos de simplicidade e sentimento que apenas poderiam culminar com um último brilhante mas decisivo momento em que, e aqui sim, temos de assistir à violência final. Aquela que irá acabar definitivamente com todos os tormentos porque um jovem passou... e que aponte o dedo aquele que não adorou aquele segmento final onde todos sem excepção deram um pequeno sorriso.
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"Pierre: O que separa os humanos dos animais não é só a inteligência. É também a moral."
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10 / 10
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