sexta-feira, 22 de abril de 2016

The VVitch: A New-England Folktale (2015)

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A Bruxa de Robert Eggers é uma longa-metragem norte-americana que será exibida na secção Boca do Inferno do IndieLisboa - Festival de Cinema Independente que decorre até ao próximo dia 1 de Maio em várias salas da capital.
William (Ralph Ineson) e Katherine (Kate Dickie) são um casal recentemente chegado da Europa e vivem numa pequena aldeia de New England em meados do século XVII. Cristãos devotos e com uma vida algo segregada da demais comunidade, são convidados a sair ou serem julgados por práticas pouco convencionais.
Quando optam por abandonar a comunidade e abraçar uma nova vida junto da floresta, o casal e os seus cinco filhos esperam uma vida difícil mas segundo os seus propósitos e convicções até que Samuel - o recém nascido - desaparece misteriosamente enquanto à guarda de Thomasin (Anya Taylor-Joy) a filha mais velha prestes a entrar numa idade adulta.
Estará esta família perante um mal maior que se aproxima e testa as suas convicções ou, por sua vez, existirá o próprio mal dentro daquela família disfarçada com rostos inocentes e vindo do mais inesperado dos locais?
Realizador e argumentista de The VVitch: A New-England Folktale, Robert Eggers constrói uma história que tanto pode ter de lenda - pela sua vertente mais mística - como de realidade se analisarmos friamente o que está por detrás deste conto. Recorrendo inicialmente a esta perspectiva, The VVitch: A New-England Folktale é uma história que se centra nos medos mais profundos que se iniciam com as grandes alterações de vida - aqui a emigração - e que se perpetuam com as incertezas inerentes a um novo rumo no desconhecido onde tudo é estranho para quem chega mas, principalmente, quem chega é estranho para tudo o demais que já lá se encontra. Dito isto, esta família chega a um local onde já existem colonos, com leis estipuladas e uma forma de vida dentro das "regras" e normas de procedimento. Na perspectiva de "primeiro que chega é o primeiro que se serve", tudo o que chega em segundo lugar tem, forçosamente, de se formatar a um estilo de vida que já está imposto. Sem que muito seja revelado daquilo que opôs uma comunidade a esta família levando-os a terem de abandonar a comunidade à qual agora deixam de pertencer, as únicas informações que o espectador recebe são que para lá se manterem teriam de "emendar os seus comportamentos" deixando, desde este instante, indicações de que algo já estava errado dentro de uma família aparentemente normal.
É com base nesta perspectiva que podemos, de seguida, juntar alguns elementos que vão sendo lançados com o desenvolvimento desta história e que contrariamente à mudança de grupo se centram exclusivamente na mudança do "eu". Esta mudança, não menos importante e, por vezes, bem mais transformadora sente-se presente em elementos como o fanatismo religioso que os elementos desta família denotam ao considerarem, por exemplo, a sua própria existência como um pecado. Se a sua existência se deve graças a um pecado - sexual - então quem nasce - pais e os cinco irmãos - são todos pecadores pois ali estão como o fruto (ou prova) de que algo aconteceu.
Com a compreensão de que a sua existência se deve graças ao pecado, esta origina igualmente um outro comportamento... a culpa. A culpa de terem abandonado o seu país... a culpa por não serem compreendidos pelos demais... a culpa por serem expulsos... a culpa por desaparecer um filho... a culpa por morrer outro... a culpa pelas colheitas ficarem perdidas... a culpa pela (sua) vida não resultar. A culpa merece um castigo... Uma penalização pela sua existência. A desconfiança instala-se no seio de uma casa onde todos se conhecem mas onde, aparentemente, todos se transformam em estranhos, em raízes de um mal desconhecido e, como tal, algo que tem de ser severamente castigado e punido.
A ansiedade fruto de tudo correr mal gera a mentira - aqui quase sempre contada pela boca de uma criança - e esta, por sua vez, tem como imediata consequência a desconfiança e o medo (num espaço onde só se encontram seis pessoas que desaparecem ou morrer misteriosamente... alguém tem de ser culpado). Finalmente fruto do medo chega uma violência - agora física - onde a punição tem de ser paga através do corpo pois só através desta purga poderá - eventualmente - ser alcançado um bem maior. No final apenas a paranóia parece existir num espaço que está decididamente corrompido.
No entanto, The VVitch: A New-England Folktale entra ainda no campo da fantasia, dos contos populares e da imaginação - ou da incerteza - quando explora a ideia de que existe de facto um "mal", algo desconhecido que se apodera das mentes dos mais fracos, daqueles que cedem mais facilmente fruto de uma mente que se deixa levar pelos contos, pela incerteza do que existe e por lendas e contos místicos que existem "desde sempre". Neste conflito entre Bem e Mal... entre Deus e o Diabo... entre a evolução racional (?) do Homem e a Natureza incólume, encontramos pistas que nos indicam quais poderiam ser os comportamentos desta família e onde se encontra(m) realmente os reais problemas. Aquando da sua saída da comunidade e chegada à floresta, vemos os membros desta família a prestarem culto a uma densa floresta junto da qual começam a construir a sua nova vida e propriedade. Conhecendo (suspeitando) as lendas sobre a existência de uma bruxa... porque motivo se mantêm ali como se nada soubessem? Quando desaparece o jovem "Samuel"... as primeiras indicações para o mesmo foi o poder ter sido levado por um lobo... Elementos estes aos quais se juntam a existência de um coelho que parece transpirar a essência do mal e que indica à família que "têm" de o seguir para se perderem no centro da floresta, o corvo que se alimenta do leite materno - a imoralidade da bestialidade -, a maçã vomitada por "Caleb" como o símbolo máximo do pecado - numa clara referência a Adão e Eva -, as cabras que servem leite como alimento da família, e finalmente a grande surpresa que chega através de "Black Phillip" que lenta e calmamente observa os comportamentos desta família à espera de os comprometer e subjugar aos próprios desejos.
Numa constante subversão do imaginário, The VVitch: A New-England Folktale oscila entre as noções de comunidade, de isolamento, de loucura e de superstição que lentamente apresenta ao espectador o mais puro conto tradicional sobre bruxas, feitiços e morte mas que, no final, explana o mais elementar da Humanidade... todos temos um preço. A única incerteza é saber o quão alto é e o que cada um está disposto a fazer - (in)voluntariamente - para o obter.
The VVitch: A New-England Folktale leva o espectador ao domínio da incerteza durante toda a sua narrativa. (Des)esperamos por compreender se estamos de facto perante uma história sobrenatural ou simplesmente perante uma família que - aos moldes da sociedade do século XXI - seria considerada bizarra pelo seu fanatismo. Quando a revelação chega aquilo que o espectador mais queria era que fossem revelados todos os elementos desse sobrenatural desconhecido e qual o "depois" de uma "ThomaSIN" do qual tanto ficou por dizer e que entrou, ela própria, numa nova fase daquilo a que pode chamar de vida.
Tecnicamente exemplar e com um conjunto de elementos do imaginário do conto popular que o transformar num bem sucedido filme do género, The VVitch: A New-England Folktale apenas não atinge o pleno porque o espectador queria... muito mais. Secretamente... qualquer um de nós acaba por simpatizar - quase em absoluto - com "Black Phillip" que testemunha não só a perda como também a loucura e principalmente a perdição do Homem - a família - subvertendo-os... um a um.
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"Black Phillip: Wouldst thou like to live deliciously?"
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8 / 10
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