quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Hidden Figures (2016)

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Elementos Secretos de Theodore Melfi é uma longa-metragem norte-americana e uma das esperadas às nomeações à próxima edição dos Oscars.
No corrida ao espaço, a NASA queria o título de primeiro homem na órbita para os Estados Unidos. Para os ajudar, a organização utilizou um conjunto de mulheres afro-americanas especialistas em matemática - Dorothy Vaughan (Octavia Spencer), Mary Jackson (Janelle Monáe) e Katherine Johnson (Taraji P. Henson) que, no entanto, continuavam a sofrer as leis segregacionistas da sociedade dentro e fora da mesma.
Na Virginia de 1961, Theodore Melfi leva o espectador a uma viagem feita numa sociedade diferente ainda dividida por género e por cor revelando que o grande sonhos americano não só estava vedado a alguns dos seus como revelava que o mesmo não se alastrava pelas grandes organizações do país impedindo o seu cumprimento. Não se cumpre o sonho.... é com este pensamento em mente que Melfi adapta então a história destas três mulheres não só pioneiras na sua área específica como verdadeiros ícones da História contemporânea dos Estados Unidos - afinal, não nos podemos esquecer que esta história tem pouco mais de cinquenta anos -, conferindo-lhe uma intensa possibilidade de o analisarmos - filme e História - com as realidades de uma actual sociedade norte-americana.
Hidden Figures chega naquele preciso momento - o actual - em que aquilo que aqui é relatado de um período negro da própria História dos Estados Unidos deveria ser estudado como o que não pode voltar a acontecer. No entanto, aquilo queo espectador tem é uma realidade que se aproxima, e muito, da realidade deste século XXI, mais cinquenta anos depois dos factos expostos com esta história de afirmação pessoal e, se quisermos ir mais longe, denunciante do conflito racial norte-americano e sobretudo uma história sobre as conquistas pessoais de um grupo de mulheres que perceberam nada ter a perder a não ser a própria dignidade. Numa sociedade onde tudo joga contra elas - mulheres, numa sociedade rácica e afro-americanas -, estas três mulheres determinadas em ser alguém ignorando que iriam ficar na História do seu país como um grupo de heroínas cujo contributo para essa mesma História foi (fora) determinante mas que, ainda assim, resolveram tudo arriscar para se afirmarem como cidadãs de pleno direito num momento em que o "tempo" não as queria.
Qualquer uma destas três mulheres aqui interpretadas por Henson, Monáe e Spencer eram - para os objectivos da sociedade de então -, altamente especializadas num conjunto de áreas técnicas e de ciências que as permitiram chegar até àquela que era a organização mais ambicionada do país... a NASA. Num momento em que a corrida ao espaço opunha os dois blocos dominantes - americano e sociético - numa disputa por quem obtinha o "título" em primeiro lugar, o seu contributo (até então não utilizado) tornar-se-ia fundamental não só para afirmar o país como o número um na área como principalmente para que o fosse garantindo as condições dignas de sobrevivência daqueles que se arriscavam "nas estrelas". No entanto, a grande questão impõe-se quando as próprias não são reconhecidas - em Terra - enquanto membros de pleno direito de uma organização que silenciosamente reconhece as suas competências sem que, no entanto, lhes permita exercer de igual para igual remetendo-as para as profissões "de mulher" existentes na organização. Numa constante sucessão de acontecimentos e vontade individuais que as iriam fazer quebrar barreiras pela sua determinação e por um sentido de justiça que tardou em chegar, estas mulheres passaram a integrar a sua comunidade sem qualquer divisão de materiais, casas de banho ou até máquinas de café que... tinham de ser até então exclusivas para ela sem que mais ninguém lhes tocasse.
A liberdade sempre tão desejada e nem sempre conferida, chega não só pela luta daqueles que se encontram privados dela mas também quando os que a detêm empatizam com uma causa e encontrar no tido "outro" um seu semelhante... Ainda que dramaticamente ficcionado - mas historicamente verídico -, o momento em que um "Al Harrison" (Kevin Costner) compreende as necessidades básicas de "Katherine" fazendo com que finalmente a trate como uma sua semelhante, apenas encontram rival em Hidden Figures no momento em que "Vivian Mitchell" (Kirsten Dunst) é confrontada com o seu racismo silenciado e inerente à sua personalidade, fruto de anos de uma segregação que a própria tem como "normal". O impacto das imagens, dos olhares e das não tão ligeiras expressões que a própria linguagem corporal destas actrizes e actores transmite ao espectador, são suficientemente impactantes para que o mesmo compreenda o poder de um sentimento que se perpetua no seu subconsciente individual conseguindo transmiti-lo como uma realidade presente... e não o será?
A tripla de actrizes não poderia funcionar de melhor forma criando uma história colectiva a partir dos seus relatos pessoais, e das pessoas com que se cruzaram criando os "seus" momentos protagonistas... se para "Katherine" foi o cruzar com o seu superior "Al Harrison", para "Dorothy" foi o suportar um preconceito rácico tido por "Vivian" e para "Mary" a afirmação junto de um juíz que também sofrera essa discriminação e que lhe garantiu a possibilidade de se formar tornando-se um elemento indispensável para a "máquina" da NASA. Assim, para lá das suas histórias pessoais já suficientemente ricas num conteúdo dramático capaz de fazer mover toda uma história, este Hidden Figures é ainda o relato daqueles com que "nos" cruzamos e que alteram de forma radical todo o percurso que cada uma delas conseguiu... ou pode... seguir...
Pertinente, mordaz, sobretudo actual e com uma pitada de humor inteligente capaz de quebrar os momentos mais tensos em que o espectador sente estar a observar o rosto de uma comunidade oprimida e de uma sociedade opressora, Hidden Figures é o tal filme de "afirmação" que, no entanto, precisava ser feito e visto pelos seus espectadores conferindo um conjunto de personalidades modelo que - felizmente - não "respeitam" o dito tradicional norte-americano padronizado a um conjunto de belezas de Hollywood que o país tanto cultivou durante décadas. Em Hidden Figures a beleza reside única e exclusivamente naquela tida pela inteligência e nas radicais transformação que toda uma comunidade científica puderam testemunhar quando resolveram deixar cair as tais barreiras e muros que insistiam em perpetuar-se.
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"Mary Jackson: We go from being our father's daughters, to our husband's wives to our babies' mothers..."
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8 / 10
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