sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Lar Doce Celular (2016)

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Lar Doce Celular de Alek Lean é uma curta-metragem brasileira de ficção cujo tema é não só pertinente como actual na medida em que tenta reflectir sobre as relações humanas neste século XXI no qual todos perdemos mais tempo a olhar para o ecrã de um telemóvel do que propriamente para todo o mundo que passa mesmo ao nosso lado.
Ao estilo do cinema mudo, com direcção de fotografia a preto & branco e acompanhado por música ambiente, Lar Doce Celular apresenta "Luan", um jovem homem que num passeio pela cidade esbarra com um homem que acha atraente e que persegue na esperança de que ele note. O outro, ocupado com o seu telemóvel e distante da realidade ao seu redor, só nota quando "Luan" se torna mais fisicamente presente e o puxa para o seu lado. A relação, que se torna física e aparentemente apaixonada apenas para terminar muito repentinamente não pela continuidade da história mas sim por uma questão de edição.
Aquilo que temos depois é o desenvolvimento de uma nova relação entre "Luan" e o seu novo telemóvel que comprou na rua, o qual o acompanha para todo o lado nas mais diversas actividades, incluindo em casa, esquecendo até o seu felino que passa a ser um "objecto" que ele ignora como tantos outros. Mas o que acontece quando o seu novo melhor amigo lhe é roubado? "Luan", incapaz de identificar o assaltante pois os rostos e as pessoas passaram a ser invisíveis no mundo que criou mas, no entanto, é a ausência deste telemóvel que o leva - a seu tempo - a adquirir novas competências motoras (que na prática nunca havia perdido mas sido desprezado), recordando através de pequenas pistas que afinal, sabe qual a identidade do seu assaltante.
O realizador adapta ao grande ecrã esta história de uma nova realidade social em que cada um de nós está cada vez mais dependente das novas tecnologias - dos telemóveis aos computadores portáteis - esquecendo o contacto humano, a interacção com os demais e até mesmo vermos os espaços mais ou menos interessantes pelos quais atravessamos todos os dias como se tanto espaço como a pessoa mais não fossem do que duas entidades anónimas incapazes de criar uma qualquer ligação. Saberá qualquer um de nós identificar um caminho que percorremos todos os dias ou, por sua vez, a banalidade das rotinas impede-nos de identificar o mais comum dos elementos que se encontra ao nosso lado?
Numa história que condena - a seu tempo - esta nova realidade humana bem como tenta demonstrar que o karma (por vezes) surge mesmo diante do nosso nariz, Lean utiliza alguns aspectos interessantes como conjugar esta nova realidade social mas ao "som" do cinema mudo numa dualidade entre épocas e momentos que se opõem - e opõem o espectador - a dois espaços temporais concretos da História. Interessante pela sua crítica social - ao "eu" no meio de um "nós" que nunca chegamos a observar concretamente -, falta apenas a Lar Doce Celular apenas algum trabalho na edição dos vários momentos temporais - primeiro conhecimento de "Luan" por parte do espectador, a sua relação com o seu novo apaixonado e o reencontro com a sua própria essência - dinamizando assim não só a história do protagonista mas também a sua relação com o mundo à sua volta que tanto insiste em ignorar.
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5 / 10
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1 comentário:

  1. Uau, quanta sensibilidade! Obrigado pela resenha e tbm pelas dicas do fim, gratidão!

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